quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Acordar pra dentro

Uma das frases que ouvimos muito, em tom de conselho, é Acorda pra Vida. Uma frase simples e carregada das melhores intenções para que vivamos de uma maneira mais viva, com a redundância a todo vapor. Um convite à vida no sentido mais esfuziante possível. Não há como dizermos não a um conselho destes...
Mas, muitas vezes, existem pessoas que acordam tanto para a vida que esquecem de acordar para dentro. Esquecem que não precisam estar o tempo inteiro numa aventura alucinante de adrenalina intensiva, basta apenas acordarem para dentro e verem o que realmente necessitam para que a vida seja, digamos, mais cheia de sentido.
Dá um certo medo em olharmos realmente para as nossas dores e delícias sem termos que estar com um sorriso no rosto e esbanjando simpatia (Salve Jorge!). Um receio em concluirmos que o que basta para estarmos em paz com o nosso eu é pouca coisa, é simples, é inodoro e não precisa estar estampado na nossa prepotente autossuficiência.
Acordar pra dentro é necessário. É eficaz. É de graça. Não aceita cartões. É apenas um diálogo do eu com o eu mesmo.
Definir como difícil, talvez, seja a escolha mais coerente... Deve ser por isso que muitas pessoas, inclusive Lispector, preferem uma verdade inventada a não terem que cortar defeitos que seguram o edifício inteiro.

domingo, 17 de outubro de 2010

Alegria Alegria

E ganhei o Oscar da Alegria.
Numa dinâmica realizada no dia do professor fui contemplada como a pessoa mais alegre da escola. Cheia de sorrisos, saltitante e serelepe recebi meu prêmio.
Realmente, sou alegre. Sou muito alegre. Rio da vida. Gargalho do inesperado. Faço piada com o destino. Sorrio com a boca, com os olhos e com os cabelos.
Sem deixar o mérito de Miss Alegria-Alegria, tenho algumas considerações sobre eu ter ganho este prêmio.
Ganhei o Oscar da Alegria porque vivemos num mundo em que a moda agora é ser triste e anunciar essa tristeza. A tristeza dá ibope, gera buxixos, especulações, conversas. Um sorriso estampado no rosto não comove ninguém, não gera rótulos, não emite opiniões, não é capa da Contigo, não vende, não gera capital...
Prozac no almoço e Fluoxetina no jantar são os hits do momento. Sem um faixa preta no armarinho do banheiro? Minha cara em que mundo vocè está vivendo??? Vá logo no psiquiatra fazer parte desta galáxia.
Ganhei o Oscar da Alegria não por ser hipócrita em um mundo que clama pela tristeza enaltecida. Ganhei porque ainda sou do tempo antigo. O tempo em que a tristeza se resumia ao choro escondido na hora de cortar cebola, a tristeza emergida na hora do banho, a tristeza comedida, a tristeza que o Bonner não anuncia.
Sou do tempo da tristeza autista. Da tristeza egoísta que não precisa ser compartilhada com terceiros.
Sou do tempo da tristeza só minha e de mais ninguém... quando muito do travesseiro.

domingo, 10 de outubro de 2010

A temporalidade do amor

Assisti ao filme Novidades no Amor com Catherine Zetta-Jones e Justin Bartha e cheguei à conclusão de que há tempo para o amor.
O amor é temporal. Não no sentido cíclico de um começo, um meio e um fim, mas no sentido de que quando não é a hora, nada feito.
No filme, Zetta-Jones é recém divorciada e encontra aconchego nos braços do babá de seus filhos, Bartha. O xis da questão é a diferença de idade: ela com 40 anos e ele com 25. A diferença de idade não é discutida no filme e nem elencada o suficiente para o tema ser o preconceito. O que é evidenciado é a lacuna de experiências oriundas da idade. O amor se fez. Mas não bastou. Ele nao tinha vivências suficientes para adentrar no universo dela.
Ele era aquém e nada tinha haver com idade, mas sim com espaços de tempos.
Alguns anos se passam e a diferença de idade, é claro, continua a mesma: 15 anos, mas a diferença de emoções vividas praticamente se iguala e então a relação se concretiza.
E o amor é assim. Pode explodir em grau 9 na escala Ritcher, mas na semana anterior, na semana seguinte, no ano passado, em tempo errado, em momento inoportuno. O amor é temporal porque não só do amor se mantém as relações...
E então é rímel escorrido na certa.

sábado, 9 de outubro de 2010

O fantástico mundo On Line

Sabe o que mais me encanta neste mundo virtual? A capacidade de controle de nossas imagens. Somos senhoras de nossas aparências e só deixamos à mercê o que queremos deixar. Nos photoshopamos, editamos, selecionamos, somos sorridentes ao extremos e felizes à décima potência. Nossos cabelos são esvoaçantes, temos blush natural, nossas unhas sempre bem feitas e nossas vidas uma grande festa regada a energético.
Faxina? Ninguém faz. Empréstimo? Também não. Raxar a gasolina? Psssiii, não comenta.
Escolhemos partes de nossas vidas que merecem páginas de uma biografia e as superlativizamos positivamente. Nos evidenciamos em frases através de outros. Indecisas e instrospectivas? Solicitamos Lispector. Um pouco solícitas à paixão? Neruda na tela. Nostálgicas? Nando Reis nos quebra este galho.
Gritamos aos quatro cantos do mundo o nosso sentimento, nossa vontade e nossa insensatez sem sermos objetivas. A subjetividade é nossa aliada no mundo virtual.
E isso me encanta...Nada de mais em potencializarmos as vitórias e deixarmos de fora as derrotas. O problema é supervalorizarmos a nossa vida on e esquecermos que a vida que merece ser bem editada mesmo é aquela que temos quando estamos off.

O futuro não é mais como era antigamente

Certa vez no aniversário da escola, há 15 anos, todos os alunos participaram da Cápsula do Tempo. Explico: A escola estava fazendo aniversário e pediu que os alunos escrevessem sobre suas perspectivas profissionais de futuro em 15 anos. Escrevemos, guardamos na cápsula e esta foi enterrada.
Bom, a questão é que fiquei sabendo que a cápsula do tempo será aberta e então um sentimento estranho adentrou em minha aura de diva. O porquê? Não lembro das minhas perspectivas. Não lembro o que eu queria há 15 anos. Tenho medo de não ter correspondido às minhas próprias expectativas.
Não quero me decepcionar, mas com certeza não escrevi que em 15 anos o que eu faria de mais delirante seria um memorando circular ou um ofício pedindo verbas para quebrar paredes e fechar duas portas. Que minha adrenalina estaria em seu auge quando eu descobrisse assassinos em filmes de serial killers e até lesse sobre eles para descobir mais assassinos nos próximos filmes. Que minha boa ação mais notável foi participar de um projeto cujos custos foram todos pagos e minha estadia foi regada à temperatura permitida por mim. Que o Prêmio Nobel que deixei para o meu país foi trabalhar nas eleições. Que o que mais faço hoje é explicar que o trema não se usa mais e que as regras do hífem mudaram completamente. Que meu momento mais famoso foi quando apareci no Jornal do Almoço da minha cidade.
Não escrevi nada disso, não... Com certeza, em minhas expectativas algo como Hollywood ou Pentágono estariam presentes.
Percebo que o que há de mais cruel é termos que olhar pra trás e vermos que nossos planos perfeitos de realizações superlativamente fantásticas não se concretizaram. E que o futuro não é mais como era antigamente...
E quanto à Cápsula? Não apareço lá, nem a pau, Juvenal.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Da obediência do papel de ser

Não vejo cores que não combinam.
As cores que vejo se entrelaçam nas combinações dos tons.
Uma assegura a outra, define, sinaliza, entranha.
Não vejo cores que não combinam.